sábado, 30 de abril de 2011

Bringing Up Comedy, por Maria Eduarda Fernandes de Melo Santos


Como outras indústrias, Hollywood foi atingida fortemente pela Grande Depressão, mas conseguiu se recuperar lentamente através de uma variedade de métodos. Com o preço médio de 27 centavos de dólar por ingresso, o cinema oferecia uma maneira relativamente barata de se tirar férias da realidade. O público se deliciava com as fantasias espetaculares da alta sociedade, e com uma maneira de viver que eles nunca conheceriam de perto. Os personagens das screwball comedies podiam ser malucos e inconsequentes, enquanto o americano comum não podia. Mas, por uma hora ou duas, todos podiam fingir que eram Cary Grant ou Katharine Hepburn.

Esses filmes funcionavam como uma válvula de escape; um campo de batalha seguro onde se podia explorar temas sérios, como o conflito de classes, de uma maneira cômica. Mas, apesar da leve conotação social, talvez a maior marca da screwball comedy seja as situações beirando o ridículo, como acontece em “Levada da Breca” (Bringing Up Baby, 1938), onde um casal deve tomar conta de um leopardo importado do Brasil.
A história envolve Cary Grant no papel do paleontologista David Huxley, que busca uma doação de um milhão de dólares para o seu museu, e as situações inusitadas pelas quais passa após conhecer a excêntrica Susan Vance, interpretada por Katharine Hepburn. No maior estilo screwball comedy possível, também inclui um osso de dinossauro enterrado por um cachorro, dois leopardos, brincadeiras com azeitonas, prisões injustas e inúmeras performances da música I Can’t Give You Anything But Love.

Durante todo o filme, Grant e Hepburn executam uma estranha e engraçada dança ao redor um do outro, ao mesmo tempo em que presenteiam o público com um dos melhores diálogos de comédia já escritos. Sozinho, o personagem de Grant é desajeitado e controlado pela noiva, sua colega de trabalho. E sem ele, a personagem de Hepburn é simplesmente insana. Mas junta-se os dois, os personagens parecem se transformar, e a química é evidente. Mesmo com direção e roteiro incríveis, se Grant e Hepburn não tivessem imediatamente se estabelecido como duas pessoas tão frustradas uma com a outra que não conseguem ver que foram feitos um pro outro, o filme provavelmente não seria tão envolvente. O filme, além de ser uma comédia, é também uma história de amor da qual o público aprende a gostar no desenrolar dos acontecimentos.

Para este personagem, Grant decidiu abandonar todo o carisma e charme que geralmente traz em suas comédias românticas, em troca de um par de óculos e um jeito nerd. A personagem de Hepburn, embora por vezes destrambelhada, é cheia de vida, e após perceber que o ama, faz de tudo para ajudar Grant a recuperar um osso de dinossauro que é a peça final de um grande projeto dele.

Na ainda conservadora sociedade de 1938, uma única fala do filme causou grande polêmica: na cena onde a tia de Susan, Mrs. Random (também a possível doadora de um milhão de dólares para o museu de David), chega em casa e encontra David vestido com um robe feminino, pertencente a Susan, pergunta porque ele está vestindo aquela roupa. David pula e responde “Because I just went gay all of a sudden!”. Na época, a palavra gay era utilizada apenas por homossexuais, entre si; a maior parte da sociedade a usava para adjetivar coisas e pessoas alegres . A fala, que não estava no roteiro original, foi improvisada por Grant. Apesar de não haver confirmação disto, estima-se que essa tenha sido a primeira vez que o adjetivo tenha sido usado em um filme, como referência ao homossexualismo.

O legado deste filme, o segundo de quatro que Cary Grant e Katharine Hepburn fizeram juntos, é tão grande que em 1959, mais de 20 anos após seu lançamento, ainda continuava a influenciar atores e diretores. No clássico “Quanto Mais Quente Melhor”, considerado uma ‘screwball comedy atrasada’, Tony Curtis baseou sua atuação como o milionário que finge ser para seduzir Sugar (Marilyn Monroe), no personagem de Cary Grant em Levada da Breca.

Embora bastante apreciado hoje, e na posição de número 92 na lista dos 100 melhores filmes do American Film Institute, na época de seu lançamento, Levada da Breca foi um fracasso de crítica e público. Um crítico da época, Frank S. Nugent, publicou no New York Times uma resenha que dizia que o filme seria “aturável apenas para alguém que nunca viu um filme antes”.

Ao final do filme, a noiva de David Huxley, ao saber que ele havia sido preso, pergunta, assustada “Oh, David, o que você fez?”. Grant, resumindo em apenas uma fala o conceito de screwball comedy, responde calmamente “Pense em qualquer coisa, e eu já fiz”.

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