segunda-feira, 5 de dezembro de 2011
"O Bruxo de Blair", por Victor Laet
"Quem controla o passado, controla o futuro; quem controla o presente, controla o passado... quem controla o passado, controla o futuro." – George Orwell, 1984
Quando dirigia pelas estradas suecas, Bergman parara na cidade na qual cresceu e começara a observar os lugares que conhecera. Ao ver a casa da avó, o diretor escandinavo se pega pensando na possibilidade de rever a vida vivida como se adentra diferentes habitações numa casa. Assim, durantes os médios meses de 57, começavam a surgir as nostálgicas considerações as quais vingariam como Morangos Silvestres.
Que Woody Allen arquiteta suas obras nas edificações construídas por Bergman, disto não há surpresa: isto é perceptível tanto em Annie Hall como quanto em Crimes e Pecados. Assim como não existe novidade no fato dos trabalhos do nova-iorquino, em suas homenagens, acabarem por reconfigurar todo sentidos de uma primeira proposta. Se em Morangos, a nostalgia surge a partir da chegada da idade avançada e do esmaecimento dos prospectos do futuro, em 97 Allen apresenta um trabalho no qual tanto a nostalgia de quem vive, quanto a melancolia daquilo de fica abandonam o universo dos vivos. Os sentimentos citados agora são pertencentes às ficções literárias.
No (até o fechamento deste, por outrem, não lido texto) pouco-recordado Desconstruindo Harry, trata d’um escritor experimentando pela primeira vez de um bloqueio criativo. Toda a vida deste escritor, Harry, foi dedicada ao trabalho e suas vívidas obras são frutos duma vida marcada pela pobre sociabilidade do individuo. Em 1932, Huxley lançava “Textos e Pretextos” cuja introdução é tomada pelo axioma “Experiência não é o que acontece com um homem. É o que o homem faz com o que com ele acontece.” Num ataque de nervos a ex-amante de Harry diz: “your latest magnum opus emerges from this sewer of an apartment where you take our suffering and turn it into gold... literary gold!” Se em Bergman o gatilho melancólico vem da aproximação da morte, em Woody essa característica aparece do confronto do passado com o presente.
É curioso, além do mais, perceber que enquanto no filme de 57 as situações nostálgicas são perseguidas, 40 anos depois no longa-metragem estadunidense a nostalgia é a perseguidora. Em Bergman, o personagem principal passeia pela casa na qual tinha crescido e rever as cenas de um tempo passado. No caso de Woody, os seus personagens – estes frutos dos terríveis acontecimentos do passado – vêm ao presente dominar o escritor com culpa. Escrito isso, é bom parar e observar como essa distinção enluva a teoria sobre nostalgia proposta por Svetlana Boym. A russa introduz seu raciocínio ao citar a receptividade dos povos alpinos da Europa no século XVII para com a nostalgia, considerada uma enfermidade. A graça vem do fato de que se em Morangos Silvestres é a documentação de uma enfermidade por, realmente, um tempo (e o então-espaço) perdido, Harry a mostra como doença aonde o então-tempo invade o espaço. Uma maneira literal de considerar o caráter de ambivalência da nostalgia, o qual responde por ser “a repetição do irrepetível, a materialização do imaterial” proposto por Boym.
Desconstruindo Harry ainda dá a idéia de o filme, em si, ser um processo memorialístico/criativo. A montagem com inúmeros jump cuts sugere o ofício de escrever e reescrever a mesma cena, procurando a auto-satisfação em cada sentença. Algumas cenas, como os créditos iniciais, são intercaladas pela famosa tela negra e letras brancas dos filmes de Woody Allen desde a segunda metade de 1970.
Bergson propunha uma estrutura de temporalidade cônica invertida, onde presente e passado conviviam. Não somente, a relação do tempo vital e do tempo espacial era harmonizada. Logo, tempo e memória convivem. Bergson dá a imagem de um cone descansando no chão, mas não com a base com o ápice: a memória base é puro fato, a totalidade do passado, muito do que não é explicitamente consciente, embora esteja presente de alguma forma, enquanto a cúpula é o presente, em seu avanço contínuo. Segue-se que a memória, ao invés de uma regressão do presente para o passado, é sim um avanço do passado para o presente, num movimento perpétuo de expansão (para o passado) e contração (para isso).
É possível considerar que a nova abordagem de temporalidade proposta por Bergson tem uma nova representação com o caos neurótico habitual da personalidade dos filmes de Woody Allen. A imagem dos nós das highways vem a cabeça. Caos e confusão de estrutura de tempo, onde passado, presente e futuro são a mesma coisa. A imagem do nó de uma highway como estrutura de temporalidade também pode ser vingado com a expressão russa citado por Boym de que “o passado tem se tornado tão imprevisível quanto o futuro”.
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2 comentários:
Estranho,me chamo Victor Laet também !
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