Kindle, Kobo, iPad, entre outros, são apenas alguns dos inúmeros dispositivos que
se tem hoje disponíveis para a leitura de livros, revistas e jornais. Devido a
isso, o mercado editorial impresso atual se utiliza constantemente de
diferentes recursos interativos para manutenção de seu público fiel e obtenção
de novos consumidores, que já nasceram na era touch screen.
Entretanto, em meio a tantas
reformulações e visões apocalípticas sobre o futuro dos impressos, os fanzines
vivem, resistem e até se expandem, contrariando as expectativas daqueles que
negam a sobrevivência do artesanal frente ao digital. Zines, para os mais
íntimos, são publicações independentes, sem algum rigor técnico ou formal, com
a origem geralmente associada ao movimento punk dos anos 70. Nessa época, esses
livretos serviam de ferramentas responsáveis por disseminar os ideais
políticos, estéticos e culturais dessa contracultura subversiva.
Aliada a essa veia
ideológica, a estética predominante na produção dos zines e, consequentemente,
na identificação de um produto editorial como tal, é a Do It Yourself, o que tornava aquele impresso único, desligado de
uma preocupação midiática de massa, uma arma de guerrilha.
Um exemplo disso pode ser
visto no curta-metragem "Braxília", de Danyella Proença, que narra a
história dos livretinhos do poeta Nicolas Behr, que os produzia extremamente
autoral, do conteúdo à forma, com suas poesias e ilustrações sobre uma utópica
Brasília (ou Braxília?).
Em Pernambuco, existe uma
tradição zineira, sobretudo de zines vindos do punk, como o clássico
"Recifezes". Todavia, os conteúdos encontrados nos zines foram se
diversificando com críticas literárias, informativos satíricos e quadrinhos.
No filme " A febre do
rato", de Cláudio Assis, o personagem Zizo, inspirado no poeta recifense
de mesmo nome, encontra na linguagem do zine a maneira de veicular seus ideais.
Hoje, entre tantos illustrators, photoshops e recursos digitais gráficos,
Zizo continua fazendo seus tabloides manualmente, com colagens, recortes e,
claro, muita xerox. Xerox essa que foi ganhando novas utilizações mundo a fora,
após os experimentos com fotocópias de Paulo Bruscky, que é, sem dúvidas,
expoente mundial da arte-xerox.
Desse movimento estético,
vários zineiros engrenaram suas produções, como é o caso de Camilo Maia,
designer e fundador da editora Livrinho de Papel Finíssimo, que tem ajudado a
promover esse tipo de trabalho autoral na cidade do Recife, promovendo feiras
de trocas de zines, e desmistificando essa "coisa" do livro
convencional, sem depender dos mecanismos de reprodução e legitimação editorial
das grandes editoras e dos esquemas convencionais e elitistas de sucesso.
Além disso, Camilo ainda é
disseminador da cultura dos zines por meio de oficinas, como a “Zine Arte
Xerox” que aconteceu em 2011, durante a Virada Multicultural do Recife. Na
ocasião, o zineiro instruiu um grupo de estudantes e profissionais de
jornalismo, fotografia, design e afins. Grupo esse que produziu o "Xerada
= xerox+virada", uma publicação alternativa sobre o evento que acontecia
no Recife, focando em notícias que não circulavam na grande mídia. Um ano
depois, parte do grupo voltou a se reunir e criou o zine "Vanguarda
Chuva", que mescla em sua produção a utilização de softwares de
diagramação e manipulação de imagens, sem deixar de lado as possibilidades que
uma fotocopiadora permite, com a criatividade da arte-xerox. Ou seja, os zines
vão se reinventando, de acordo com o contexto o qual se insere.
As provas de que a
efervescência e a vivacidade dos zines estão em alta não são encontradas apenas
em Recife. Em São Paulo, por exemplo, aconteceu em 2013 a primeira Feira Plana,
no Museu da Imagem e do Som, que reuniu editoras independentes, fictícias,
artistas, coletivos e muitos zines de vários cantos do Brasil e da América
Latina. Foram mais de 80 expositores, e o público de colecionadores e ativistas
da cultura independente passou dos 3000. Além disso, a Feira Plana ainda foi a
única representante brasileira de zines na NY Art Book Fair, que aconteceu no
MoMA.
Por esses exemplos, nota-se
que pelo espaço tomado e consolidado, os zines adquirem hoje um patamar
distinto das produções editoriais tradicionais, e devido a seu fator estético
do "Faça Você Mesmo", junto com a valorização do manual - mesmo em
casos de utilizar fotocopiadoras e conseguir médias tiragens-, vai se
encaixando em setores entre a arte e o design, superando o sentido
revolucionário inicial e se tornando uma experiência gráfica, visual e tátil
dentro de um mundo excessivamente touch
screen.
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