Em
uma espécie de América pós-apocalíptica, treze distritos subservientes — cada
um com uma função industrial específica — se rebelam contra a autoritária
Capital. Com a revolução esmagada, a punição exige que cada um dos doze
distritos restantes sacrifique anualmente um casal de adolescentes para um
duelo sádico que permite apenas um sobrevivente. Até que uma ameaça de suicídio
romântico em um desses ditos jogos
desencadeia um fervor social que aparentemente carregará a saga Jogos Vorazes até seu climax.
Indiscutivelmente,
é mais uma adaptação de série literária juvenil feita para encher sem
dificuldades os bolsos de Hollywood. Alguns já torcem o nariz a partir daí,
outros esperam até descobrir que a premissa é esmagadoramente semelhante à
cultuada produção japonesa Battle Royale
(Kinji Fukasaku, 2000). É possível, no entanto, e com o cinismo de lado, que
apesar das evidências Jogos Vorazes seja,
imagine só, bem original.
É
difícil se livrar da impressão de ingenuidade política. O Estado autoritário
pós-apocalíptico tem presença forte na literatura mainstream desde George Orwell ou antes. Ele sempre faz um bocado
de coisas grotescas, seja encher o mundo de câmeras de segurança, queimar todos
os livros ou impedir a concepção humana natural. Recentemente, o péssimo Elysium (Neill Blomkamp, 2013) deixou a
Terra para os pobres e mandou os ricos para um satélite onde eles poderiam
falar francês e ser curados do câncer sem ninguém para lhes pertubar pedindo
esmola. A indignação humana com essa desigualdade óbvia é comum, batida,
ingênua e hipócrita, assim como o tom revolucionário que parte de protagonistas
carismáticos.
Jogos Vorazes vai
um pouco além desses seus tantos antecessores. Em determinado aspecto, talvez
até involuntariamente, o filme se denuncia um fruto claro do momento estético
em que surge. A crítica não é voltada apenas para um hipotético Estado
autoritário, mas também para um não tão hipotético assim Estado afetado.
A
Capital é um monstro colorido em glitter e perucas assustadoras. Seus
habitantes parecem saídos de um livro do Dr. Seuss. Eles berram em excitação,
riem histericamente de absolutamente tudo e aplaudem com ânimo todos os pupilos
que entusiasmadamente mandam para a morte. Os Jogos Vorazes pelos quais torcem
são uma consequência óbvia dessa afetação, dessa sociedade de cores
espetaculares. Sangue! Amor! Traição! Os exageros são parte essencial do
espetáculo.
E em
que tempo mais isso poderia ter sido baseado que não neste? A referência não é
ao nazi-fascismo ou ao socialismo stalinista, mas às sandálias infantis que
brilham no escuro, à primeira-dama que entrega um Oscar, ao programa de
entrevistas levado aos pulos e gritos, às manchetes superlativas que levam a
uma lista de .gifs.
Não
se trata também de criar um maniqueísmo em torno desse universo de brilho
intenso. Nem este texto nem, imagino, Jogos
Vorazes são um ataque à afetação midiática que toma o mundo. Ainda assim, a
sátira é divertida e cumpre sua função nesse imaginário específico. Além do que
nos permite ver Elizabeth Banks neste modelito.
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