domingo, 9 de outubro de 2011

“Meus Pequenos Amores”, por Evan Diniz


A julgar pelo título do filme de Jean Eustache, percebe-se a sensibilidade em contato direto com o tema da obra. “Mes Petites amoureses” traz a história de Daniel, 13 anos, que vive aos cuidados de sua avó numa pacata vila na França. O dia-a-dia de Daniel entre escola e brincadeiras com seus amigos trazem o olhar qual se demonstra mais puro. Como uma linha constante, a vida de Daniel na sua vila é despreocupada, até mesmo previsível de certa forma. Seus amigos, em especial uma menina que dentre eles o desperta um interesse incomum fazem parte de seus sonhos, compartilhando com ele a fase inocente de sua vida. Algum tempo depois sua mãe retorna e decide levar Daniel consigo para viver com ela no apartamento que mora com seu recente namorado na cidade grande. A partir desse ponto a vida de Daniel muda drasticamente, lá não há amigos, não há dinheiro para escola e sua mãe arranja um trabalho de ajudante numa oficina. Sem nenhuma referência de como crescer e olhar para o futuro, para as pessoas ao seu redor, para a cidade, começa então um processo de amadurecimento e o contato mais intenso com uma nova forma de olhar para o mundo perdendo cada vez mais a lente da inocência configurada em sua infância.

Desejos e curiosidades cercam o protagonista em sua pré-adolescência. De início temos um Daniel observador, atento e de certa forma relutante às imposições que lhes são ordenadas. Mas de outro lado temos o Daniel que se deixa levar por essas novas sensações e inquietações, como quando Daniel vai ao cinema e observa um adolescente flertando com uma menina, arrancando-lhe um beijo. Ele imita o modo como o outro consegue o beijo, conseguindo também logo após. Também na oficina à noite, quando observa os casais se encontrando na calada da noite. Após algum tempo Daniel conhece alguns rapazes que se encontram em um bar perto de onde mora. São rapazes mais velhos desinteressados, que compartilham um mesmo tipo de estagnação na vida, onde Daniel encontra um tipo de identificação. Essa estagnação reflete a falta de expectativa dos jovens com a própria vida. Se relacionar com alguma garota é a grande conquista para Daniel e seus amigos, para Daniel mais que uma conquista ainda, uma descoberta.

O recorte da vida de Daniel feita por Eustache para o filme se baseia nas descobertas do personagem. Daniel descobre uma nova vida, muito diferente da que tinha na sua pacata vila. Uma nova cidade, um novo estilo de vida, um novo sentimento de estar vivo e o contato com a sexualidade. “Meus Pequenos Amores” recria o olhar de Daniel para o mundo em um primeiro momento, e o transforma em outro. A partir do uso tão sensível da memória é possível se distanciar da forma de olhar o passado com as retinas do futuro.

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