domingo, 9 de outubro de 2011

"8 ½ de Frederico Fellini", por Pedro Augusto Souza Bezerra de Melo


O filme 8 ½ de Frederico Fellini conta a uma jornada de um cineasta, Guido Anselmi, dentro da sua própria consciência. Inquieto diante da insegurança sobre o tema do seu novo filme ele entra em um momento de crise de inspiração somado ao fato de ele se sentir fisicamente esgotado faz com que ele se interne em uma espécie de spa onde ele mergulha em sua própria vida. Essa situação de cansaço físico e intensa pressão profissional faz com que Alsemi adentre sua consciência investigando seus sonhos e fantasias, passando por seus dilemas e memórias confusas, o levando de volta também a sua infância.

O filme é permeado de momentos com tons oníricos e fantasiosos, algumas vezes em forma de sonho e outras apenas como um momento em que o personagem se perde em seus devaneios imaginários. Como por exemplo, a cena inicial em que o protagonista sonha que está em um carro trancado, preso no trânsito dentro de um túnel; Depois de um grande esforço, consegue sair do carro e começa a voar por entre os automóveis até chegar ao oceano, quando percebe que está preso a uma corda pelo tornozelo.

Diante desse filme em que tudo tem um viés imaginário, fantástico e há uma intensa ebulição de ideias, imagens e sentimentos com conteúdos interessantemente conflitantes, é possível fazer uma leitura das cenas contemplando o conceito Bergsoniano de durée, que é essencialmente um novo conceito de análise do tempo. O tempo usualmente é considerado geral e aplicável igualmente a todas as situações e pessoas, porém esse conceito defende a particularização do tempo como uma dimensão pessoal e subjetiva. Segundo Bergson, quando se adentra a durée, o tempo cronológico não é mais usado com o mesmo valor que teria como referência para a sociedade, pois a durée é um estado psicológico, que logicamente considera estritamente a atividade psicológica como referencial. Ideias e sensações formam o modo como o sujeito se transforma diante da experiência

Há uma cena no filme, onde o protagonista revê todas as mulheres da sua vida, juntas. Essa cena pode ser relacionada intimamente com o livro Matéria e Memória de Bergson, no sentido de que é possível inferir do texto uma ideia de que os corpos ao redor do sujeito refletem as possíveis ações do sujeito sobre eles. A cena citada aqui mostra nitidamente uma diferença no modo do sujeito tratar cada objeto, no caso, as mulheres que passaram por sua vida, de acordo muitas vezes com o tratamento que ele recebia dos objetos o que remonta a outro pensamento do mesmo livro, que mostra como mudando os objetos, de lugar que seja, a relação dos mesmos com o sujeito vai ser modificada também. Há também uma relação dos objetos (as mulheres) entre si, modificando assim umas as outras. É também importante fazer a ligação dessa cena, que é um devaneio onírico, com a relação Idealismo versus Realismo, exposta no livro, até por ser um sonho fica mais fácil de provar uma ideia do livro, que diz que não há percepção que não esteja impregnada de lembranças, e a evidência mais simples do emprego dessa ideia no filme é o fato de todas as mulheres nessa cena foram em algum momento personagem na vida de Guido Anselmi.

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