domingo, 10 de agosto de 2014

"Celebração da nostalgia", Guilherme Cavalcante


Diante de tantas transformações sociais e ideológicas que marcaram a década de 60, era de se esperar que o musical americano, calcado em sua fórmula conservadora de entretenimento familiar, fosse perdendo fôlego entre o público. Por outro lado, a época já sinalizava o ideal contemporâneo que se manifestou entre as artes, surgindo assim obras que incorporavam uma abordagem estética nostálgica. Filmes como Grease de 1978, evidenciavam essa referência à década de 50 com a imagem de John Travolta vestindo jaqueta de couro assim como Marlon Brando ou James Dean eram vistos no auge de suas carreiras e juventude. Grease lançou na indústria a cantora e atriz Olivia Newton-John, que em 1980 protagonizou outro sucesso musical chamado Xanadu.

Em Xanadu, ela interpreta Kira, uma das sete deusas filhas de Zeus, que tem como objetivo estimular nas pessoas a ambição de realizarem seus sonhos. Seu alvo é o artista Sonny Malone (Michael Beck), que se encontra entediado com seu trabalho de reproduzir em pinturas capas de discos de bandas. Kira aparece para Sonny como uma divindade e o deixa desorientado com sua beleza e suas aparições misteriosas. Sonny acaba conhecendo por acaso Danny McGuire, interpretado por Gene Kelly, astro dos musicais clássicos da década de 40, um empresário aposentado que vê em Sonny a chance de uma parceria que os tire desse estado de inércia. Kira os inspira a abrirem juntos a discoteca que dá nome ao filme, enquanto ela e Sonny formam um casal apaixonado que desafiará as regras dos deuses, o que criará um obstáculo em seu relacionamento.

O filme, apesar da narrativa calcada no clichê romântico, reúne aspectos interessantes que merecem destaque. O primeiro é enxergar o filme como uma ode nostálgica ao gênero musical, bastante evidenciado pela presença de Gene Kelly e seu singular personagem que em vários momentos da narrativa manifesta seu saudosismo para com a década de 40. Para os que vivenciaram a década de 80, o filme é um espetáculo kitsch com uma explosão em cores neon, tão própria à década, além das músicas que se tornaram hits. Xanadu, por sinal, é um perfeito exemplar de como o cinema mainstream estava próximo à indústria fonográfica, responsável pelo modelo de publicidade que ganhou força com o lançamento das trilhas sonoras dos filmes em formato físico. Um fato curioso sobre essa questão é que a trilha sonora teve excelente desempenho nas paradas da Billboard, apesar do fracasso de público e crítica do filme.


Dirigido por Robert Greenwald, ainda antecipa uma “estética MTV”, com seus números muito semelhantes ao que seria popularizado pelos videoclipes que passaram a ser produzidos no começo daquela década e incorporando um flerte com o cinema de animação. Xanadu é o lugar de encontro de gerações e de celebração, um lugar à prova de tédio que leva aqueles que lá se encontram a atingirem o nível máximo de escapismo, é uma reverência ao poder do musical de transportar as pessoas para uma dimensão lúdica, e é aí onde está seu valor simbólico.

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