sexta-feira, 24 de junho de 2011
Biutiful, por Houldine Nascimento
Quando da passagem de “Babel” pelo Festival de Cannes, em 2006, tanto Alejandro González Iñárritu quanto Guillermo Arriaga reivindicaram a idealização do projeto. Eles brigaram e ao que parece quem levou a pior foi o roteirista, porque, dois anos depois, Arriaga dirigiu e escreveu um longa ignorado tanto pelo público quanto pela crítica: “Vidas Que Se Cruzam”.
Biutiful é o primeiro longa que Iñárritu realizou sem a colaboração habitual do antigo parceiro. Seus filmes têm a marca de mergulhar fundo no sofrimento das personagens. Este aqui vai além do que estávamos acostumados a ver, deixando de lado as histórias cruzadas. Passado no submundo de Barcelona, conta a história de Uxbal (Javier Bardem), um sujeito que vive de negócios ilícitos, tem o dom de falar com os mortos e tira proveito financeiro disto.
Ele descobre que sofre de um tipo de câncer terminal, restando-lhe apenas dois meses de vida. Isso se torna um dilema, Uxbal tem um casal de filhos com uma mulher instável chamada Marambra (Maricel Álvarez), prostituta viciada em drogas e que não detém a guarda das crianças. É um bom pai e fica preocupado por não tê-los com quem deixar.
O drama discorre sobre uma realidade desagradável ao ser humano: a morte. Não há como escapar dela. Com a câmera na mão, Iñárritu faz questão de destacar isto. Morte de diversas maneiras: acidente, assassinato, doença. Tudo isso mostrado através de uma narrativa lenta, o que talvez seja a grande sacada. E assim como o personagem central, poucos têm a oportunidade de saber quando ela acontecerá. Encontramos também, embora não seja o objetivo principal, denúncia no que diz respeito à situação dos imigrantes ilegais na Espanha, um fato que pouco se atentou. Neste caso, representados por senegaleses e chineses.
Apesar de acreditar que o diretor tenha, de certa forma, se perdido no roteiro (que é assinado por ele, Armando Bo e Nicolás Giacobone), é um trabalho interessante. O título constitui uma espécie de ironia, pois não há nada ou quase nada bonito. Os cenários são feios, a começar pela casa onde vivem o protagonista e as crianças: suja e acabada (o porquê do título se justifica em uma bela cena entre Uxbal e sua filha, Ana). Ou então o frio porão onde vivem os chineses. O ambiente obscuro parece exercer uma influência no comportamento de Uxbal, levando-o a tomar atitudes impensadas, o que configuraria a cidade como vício.
A música de Gustavo Santaolalla chega a ser incômoda em alguns momentos, o que é proposital, evidente, para dar o tom do que é o filme, pesado do início ao fim. A fotografia do sempre excelente Rodrigo Prieto também exerce papel importante na trama. Mas o maior atrativo da fita é mesmo a presença de Bardem, um dos atores mais interessantes do momento e que carrega o fardo de um herói trágico com maestria. Este é o seu personagem mais realista, humano e com grande poder de empatia junto ao público. Por esse motivo, recebeu indicações ao Oscar e Bafta de melhor ator, além de ter vencido Cannes e Goya.
Biutiful talvez seja o filme mais delicado de Iñárritu. Aqui, o diretor nos apresenta um lado obscuro da vida e que muitas vezes fazemos questão de ignorar. Assim como a vida de Uxbal, somos devastados aos poucos, tal qual uma droga acomete seu dependente.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário